Aqui estão alguns dados que vamos analisar para perceber a realidade social no Brasil e a forma como o racismo estrutural se manifesta diariamente. Usaremos os números como base para construir um pensamento de causa e efeito. Observando como a falta de acesso à educação leva a oportunidades desiguais no mercado de trabalho; consequentemente geram desigualdade social e ausência de representatividade política. Além de contribuir com a taxa de encarceramento dos negros e manter o ciclo da violência por eles sofrida.

Todos esses dados atuais, são um retrato da forma como o racismo se instaurou no Brasil e quais as consequências da forma como a escravidão acabou no nosso país e como isso repercute nos dias de hoje, pois carrega diferenças em relação a herança escravagista de outros países.

Em nosso país, práticas institucionais, históricas e culturais foram criadas pensando na pessoa negra como sinônimo de servidão às pessoas brancas. Por isso, determinadas condutas sociais foram estabelecidas considerando de maneira implícita, princípios da escravidão que a não muito tempo, historicamente falando, são questionados, mesmo após 133 anos da abolição da escravatura.

Mesmo que hoje essas práticas sejam questionadas, elas fazem parte de toda uma construção social de séculos e se dissociar delas não é fácil. Por isso, ainda hoje, apesar de 56% da população brasileira ser negra (a soma entre pretas(os) e pardas(os)), essas pessoas são inferiorizadas e tratadas com desigualdade.
Mas queremos que você perceba essa desigualdade criteriosamente, para não parecer mais um discurso pronto, sabe? Então, se atente aos gráficos e vá construindo um raciocínio que liga todas as informações, do começo ao fim. Vamos lá.

Apesar de serem maioria, pessoas negras representam a parcela da população que têm menos acesso e mais dificuldade de encontrar oportunidades para deslocar a taxa de analfabetismo, por exemplo, pois 9,1% dos negros de 15 anos ou mais é considerado analfabeto funcional, enquanto que, entre os brancos a taxa é de 3,9%¹.

Isso nos leva a refletir, como as oportunidades para uma pessoa analfabeta, podem ser iguais às de uma pessoa que teve acesso a um ensino de qualidade?
¹ IBGE, 2019.

Uma das metas do Plano Nacional de Educação (Lei n° 13.005/2014) tem como objetivo elevar a taxa bruta de matrícula na educação superior e prevê que, até 2024, 33% da população de 18 a 24 anos esteja cursando ou concluindo a universidade.

Nos últimos anos, houve um aumento de 400% de pessoas negras em espaços universitários, chegando a formar a maioria de 50,3% entre os estudantes das instituições públicas de ensino superior². Mas, esse número corresponde às pessoas que frequentam e não às pessoas que realmente alcançam a diplomação.

36% dos jovens brancos, na faixa etária dos 21 anos, estão estudando ou terminaram sua graduação. Já entre pretos e pardos, esse percentual muda para apenas 18%³.
Você conhece alguém que pode ser representado nesses números?
² IBGE, 2018
³ Pesquisa publicada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)

Porcentagem de jovens
que estão estudando ou
terminando a graduação.

Brancos
36%
Negros
18%

Fonte: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)

A dificuldade de permanência dos negros nas instituições de ensino superior, faz com que esta população tenha maior taxa de desocupação, de 13,6%, contra 9,3% entre os brancos. Assim, recorrem mais ao trabalho informal, atingindo o percentual de 47,4% dos trabalhadores nessa situação⁴.
⁵ IBGE, 2019

Em 2018, pretos e pardos tinham um rendimento domiciliar per capita médio de R$934,00. Enquanto a média dos brancos era R$1.846,00⁶. Considerando que o salário da população significa, na prática, diferentes condições de saúde, conforto, qualidade de vida e lazer, uma família remunerada com quase o dobro de outra tem acesso a quantas oportunidades a mais?
⁶ IBGE, 2018

Mais de 70% dos brasileiros têm chefes brancos, resultado da cultura das empresas de não promover funcionários negros para cargos de gestão e liderança. Além disso, os brancos ganham em média 76% a mais do que os negros⁷. O que acarreta, entre outras coisas, no fato da população negra ser maioria entre os residentes de periferias e nos índices de pobreza. Em 2019, o IBGE constatou que 31,3 milhões de pretos ou pardos viviam em condições de moradia precárias.
⁷ Pesquisa realizada pelo Instituto Locomotiva, em 2021

Os brancos ganham 76%
a mais do que os negros

Fonte: Instituto Locomotiva

Por conta desses fatores, a população negra é vista com discriminação em muitos contextos sociais. 69% das(os) brasileiras(os) pretas(os) apontam que já foram discriminadas em lojas, restaurantes ou supermercados⁸. Reflita junto ao vídeo abaixo sobre essas discriminações no seu contexto diário:
⁸ Pesquisa realizada pelo Instituto Locomotiva, em 2021

Fonte: Regina Casé (instagram)

52% das(os) trabalhadoras(es) pretas(os) relatam já terem sofrido preconceito no próprio ambiente de trabalho⁹. Isso é um reflexo do racismo institucional. A campanha “Teste de Imagem”, de 2016, demonstra a visão que recrutadores têm de pessoas negras e brancas apresentadas nos mesmos cenários. Assista:
⁹ Pesquisa realizada pelo Instituto Locomotiva, em 2021

O professor e filósofo Silvio Almeida nos ensina que o racismo se expressa concretamente como desigualdade política, econômica e jurídica. Dessa forma, a população negra tem mais dificuldade de chegar a posições de poder e, consequentemente, maior dificuldade para gerar novas políticas públicas que garantam uma sociedade mais igualitária.

A porcentagem de deputados federais eleitos no período de 2016 a 2018, por exemplo, era de 75,6% brancos e apenas 24,4% negros¹⁰. E segundo levantamento da Vagas.com, os negros ocupam em sua maioria posições operacionais (47,6% do total da população negra) e técnicas (11,4%).
Nas últimas eleições, você votou em candidatas(os) pretas(os) ou brancas(os)? Quantas(os) candidatas(os) negras(os) você conhece?
¹⁰ IBGE, 2018

Porcentagem de deputados federais eleitos no período de 2016 a 2018

Negros
0%

Fonte: IBGE, 2018

A falta de representatividade, de políticas públicas igualitárias, as condições precárias de trabalho, a discriminação e o preconceito resultam nos altos índices de negros detentos no Brasil, somando 67% da população carcerária no país*¹¹, sendo que o Brasil é um dos países com maior índice de encarceramento no mundo.
¹¹ Infopen – Departamento Penitenciário Nacional

Os negros somam 67% da população carcerária do país.

Fonte: Ifopen – Departamento Penitenciáerio Nacional

Nos índices de violência, a população negra é a maioria das vítimas. O que demonstra que os atos violentos são normalmente motivados pelo racismo. Em 2018, 75 a cada 100 pessoas assassinadas no Brasil, eram negras¹². O mesmo percentual aparece quando se analisa o perfil de quem morre durante ações da polícia. A violência que levou à morte de pretos e pardos no Brasil, no intervalo de 2007 a 2017, cresceu 10x mais do que contra brancos¹³.
¹² Fórum Brasileiro de Segurança Pública, 2018
¹³ Segundo o Ministério da Saúde.

Pessoas assasinadas no Brasil.

☠️
0%

75% são negros

Fonte: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)

Esse é um reflexo da necropolítica no nosso país, que o Achille Mbembe define como sendo o poder do estado de ditar quem pode viver e quem deve morrer, com base no biopoderBiopoder se refere aos “dispositivos” e tecnologias de poder que administram e controlam as populações por meio de técnicas, conhecimentos e instituições. Os biopoderes se ocupam da gestão da saúde, da higiene, da alimentação, da sexualidade, da natalidade, dos costumes, etc., a medida em que essas se tornaram preocupações políticas. Fonte: Portal Politize!. E num país onde o racismo é estrutural, os negros estão mais sujeitos à morte e violência. Entenda:

A violência contra a negritude não acontece apenas de forma física, mas também por meio de desqualificações, agressões verbais, discriminação e mesmo falsas acusações. O caso de Matheus Ribeiro, acusado por dois brancos do roubo de sua própria bicicleta, ilustra o que estamos falando. Assista à reportagem:

Não refletir sobre o papel do branco na desigualdade social e racial é insistir na ideia de que essas disparidades são um problema exclusivamente do negro, constantemente “estudado, dissecado, problematizado”, como explica a psicóloga Maria Aparecida Silva Bento. E como pudemos ver através dos dados apresentados, a existência do racismo e de suas consequências para as pessoas negras são irrefutáveis, mas mesmo assim, é possível e comum que pessoas brancas neguem ou não tenham consciência da sua branquitude e o lugar de poder e de vantagem estrutural que a cor de sua pele lhes concede.

Fique tranquila(o), você vai entender melhor esse termo (branquitude) e como se relaciona com ele, nas próximas fases. Mas reflita sobre esse dado enquanto isso:

A pesquisa realizada pelo Instituto Locomotiva, com 1630 entrevistados em 72 cidades do país, no ano de 2021, mostrou que 84% dos entrevistados percebem o racismo, mas apenas 4% se consideram preconceituosos. E é por isso que ao longo desse percurso frisamos a importância da consciência sobre a branquitude.

 

Dica de leitura complementar: Necropolítica – Achille Mbembe;

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Este conteúdo teve como principais referências:

ALMEIDA, SÍLVIO. Racismo Estrutural. Feminismos Plurais. São Paulo: Editora Jandaíra, 2020. (Capítulo – Raça e racismo)

CARONE, Iray; BENTO, Maria Aparecida Silva ( org.). BRANQUEAMENTO E BRANQUITUDE NO BRASIL. In: Psicologia social do racismo – estudos sobre branquitude e branqueamento no Brasil. Petrópolis, RJ: Vozes, 2002, p. (25-58).

CURSO RACISMO E POLÍTICA – QUESTÕES CONTEMPOR NEAS. (KOPE).
Aula 06 – “Racismo, necropolítica e sistema de justiça criminal”.
Professor: Cleifson Dias

Aula 08: “Racismo e impacto do racismo no mercado de trabalho”.
Professora: Alessandra Benedito.